Cristal

A felicidade é frágil...

Sunday, December 09, 2012

Amor e Vida



Dois octogenários, Georges e Anne, professores de música, vêem as suas vidas abaladas por algo inesperado: um acidente vascular cerebral de Anne. Com isto, o amor que os une é posto à prova... Amour, de Michael Haneke

Foi esta a história que me fez renascer um conjunto de questões acerca da vida, do amor, da morte e da dignidade humana.

Não sei se toda a gente sabe o que é a Vida. Eu própria tenho algumas dificuldades em defini-la... Vida é o que nos corre nas veias, é o ar que respiramos, é o que nos faz existir... É por isso algo inestimável, algo que sinceramente me custa crer que um dia hei-de perder. No entanto, a maioria de nós vê a vida sem barreiras físicas inerentes ao próprio corpo. Ou seja, temos todos quatro membros funcionais, cinco sentidos que operam minimamente e órgãos que cumprem as suas funções básicas sem limitações. Por isso, não sabemos o que é viver de outra forma...

Amor... Aí está algo também difícil de definir. O que é o amor? Amor é tudo fazer sentido, é existir mais através do outro, é sermos nós através do outro, sendo sempre cada um de nós... É fazermos o outro sorrir, é andar com ele de mãos dadas sem querer saber de mais nada... É olhar o infinito do céu e querer voar até lá... É tanta coisa... E quase nada que se consiga concentrar nas palavras... 

Penso que quem ama verdadeiramente não lhe interessa mais do que se sentir bem, fazendo o outro sentir-se bem também. Mais, necessita que o outro se sinta feliz, bem, para que esteja também ele bem e feliz. O seja, acabam por existir acções mútuas para que isso aconteça. Não admira que quem ama verdadeiramente não queira ver o outro sofrer... Muito menos fisicamente... E surge-me quase insuportável a ideia de ver o outro decair progressivamente nas suas capacidades físicas e mentais...

O filme é chocante, abála-nos... Se por um lado trabalha o lado do amor e a decadência do corpo, por outro lado também aflora outras questões, nomeadamente com a morte de Anne e a forma como ela ocorre... Claro que não questiono a nossa não legitimidade para tirar a vida de alguém. Mas, teremos nós legitimidade para prolongar uma não-vida? Esta é a grande questão que importa cada vez mais trabalhar...

Todos os dias em que chego ao trabalho e me deparo com dezenas de velhinhos acamados, que não falam, não comem e por isso têm sondas nasogástricas por onde "são alimentados", têm algálias e necessitam que os mudem de posição várias vezes por dia, porque também não o podem fazer sozinhos, sinto o mu coração apertado. E sinto-me também a compactuar com uma sociedade que perpetua o sofrimento de pessoas... Não acredito de grande parte delas quisesse viver nessas condições... Viver completamente dependente, sem capacidade de comunicar, sem verbalizar nada para além de sons monótonos e automatismos sem sentido... Será que amar é perpetuar este estado de forma irracional e teimosa? 

Não sei... Só sei que cada vez percebo mais o que dizia a minha avó ao dizer "Deus me leve de repente, para que não sofra e não faça sofrer". Foi de facto o que aconteceu... Doeu muito quando ela partiu, mas recordo-a sempre como ela era em pleno: cheia de vida e com toda a sua lucidez e vitalidade física.

Ficam apenas algumas questões para que todos acordemos para esta realidade... E se fosse tudo ao contrário?


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